À Descoberta de Miranda do Douro


4º Passeio BTT Pelas Arribas do Douro

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O Clube de Ciclismo de Vila Flor no 4º Passeio BTT Pelas Arribas do Douro

 

 

O 4º Passeio BTT Pelas Arribas do Douro, em Miranda do Douro no dia 3 de Fevereiro de 2008, prometia ser um grande passeio. Conhecedor que sou daquelas paragens, estava ansioso.
O grupo chegou cedo a Miranda do Douro. Havia ainda pouco movimento em torno do Pavilhão Multiusos onde decorria o Festival dos Sabores Mirandeses. À medida que outros atletas foram chegando, chegaram também algumas nuvens escuras que provocaram impaciência e precipitaram a partida, bastante desorganizada.

Depois de andar quase um ano com uma capa de água na mochila, caí na asneira de ir para Miranda sem ela! Paciência, vamos em frente.

Partimos para o centro histórico da cidade. Passámos a e seguimos até ao Castelo. Daqui descemos aos bonitos espelhos de água, recentemente criados, onde há pistas para bicicletas muito agradáveis, quando o clima está favorável. Voltámos à cidade e começámos a prova propriamente dita. O percurso parecia-me bastante interessante. Eu aprecio mais do que o prazer da bicicleta, aprecio a paisagem, a história dos locais e, é claro, a companhia.

Seguimos pelas arribas do Douro, muito perto do Rio Douro, numa das mais belas paisagens do Parque Natural do Douro Internacional. Não é à toa que Miranda do Douro se “vende” como Paraíso Natural. No alto das arribas, o homem aproveitou as defesas naturais e construiu castros onde viveu e onde ainda se mantém. Passámos castros, azenhas, cerrados, manadas de vacas mirandesas e Vale de Águia, envolta na sua habitual tranquilidade. Depois de alguns quilómetros em direcção a Pena Branca virámos a nascente até Aldeia Nova. Seguimos algum tempo pela estrada e depois por um trilho, de novo perto das arribas do Douro. Nesta altura já o terreno se apresentava muito pesado, colando-se às rodas da bicicleta. Chegámos a Paradela, onde nos esperava o reforço. Havia grande variedade mas a alheira e chouriça assadas na lareira, ali ao lado, estavam bastante saborosas.

Sair dali já foi uma decisão custosa. A etapa seguinte seria subir ao Santuário de Nossa Senhora da Luz, ponto mais alto de todo o concelho de Miranda do Douro. Apesar de estarmos num planalto, este cume eleva-se a 898 metros ultrapassando em altitude o ponto mais alto do concelho de Vila Flor (852 metros em Alagoa). Chegar lá ao alto foi um martírio. Fez-me lembrar os milhares de emigrantes ilegais que atravessaram aqueles caminhos, na década de 60, pela calada da noite, evitando a guarda-fiscal e os carabineros. Mas muitos mais habitantes das aldeias vizinhas, se arrastaram por estas colinas, carregando às costas fardos de contrabando. Não para enriquecer, mas para ter pão para alimentar os seus filhos. Em Constantim, muita gente o pode testemunhar.

Quando chegámos ao Santuário, protegidos pela pequena capela, avaliámos a situação. Estaríamos a meio do percurso, mas o clima estava insuportável. Chovia torrencialmente e o vento era fortíssimo. Já não era um passeio, era quase uma luta pela sobrevivência.

Não sei quantos mais mas, uma meia dúzia de atletas desceu a encosta comigo em direcção a Constantim. O meu pensamento era só um, chegar a Miranda. Os caminhos encheram-se de água e lama; o vento tornou-se mais forte; o ar gelava; a chuva era tão violenta que magoava na cara. Em muitos momentos, não adiantava pedalar, o vento teimava em nos empurrar em direcção a Espanha, exactamente em direcção contrária à que queríamos seguir. Durante algum tempo perdi a localização. A visibilidade era pouca, apoio não havia. Só havia uma solução, seguir em frente, pouco a pouco.

Não havia mais condições para reportagem. Foi pena. Passámos ainda pelo Picão. Este lugar também é cheio de história e de histórias. Aqui se deram acontecimentos misteriosos durante mais de 16 anos. Aqui houve aparições de Nossa Senhora entre 1894 e 1910. A água que ainda hoje sai da fonte era muito procurada, curava doenças. Tudo isso ficou mais enterrado do que o pneu da minha bicicleta na lama dos caminhos.

Com mais um esforço, alcançámos a estrada do Santuário do Nazo. Já tinha decidido: trilhos, já bastam por hoje. O mesmo devem ter pensado os poucos ciclistas que conseguia ver, uma vez que todos apanharam a estrada em direcção a Miranda do Douro, onde chegámos com mais de 50 quilómetros percorridos, debaixo de incríveis condições.

Depois de um banho quente, seguiu-se o merecido almoço. Num Festival de Sabores era um pecado servir mal. Para rivalizar com a deslumbrante paisagem do planalto e com a riqueza do seu folclore, só mesmo os sabores da sua gastronomia.

Todas as agruras da prova foram esquecidas, um pouco de vinho Pauliteiros retemperou as nossas cores e a boa disposição reinou.

Para terminar, foram entregues os brindes e, para nosso “contentamento”, recebemos uma taça cada um!

E foi assim: mesmo num dia cinzento, gozámos os prazeres (e os desprazeres) do Planalto Mirandês, levámos as cores e o nome de Vila Flor até à Raia e posemos os dois pés (ainda que cheios de lama) em Espanha.

 

Aníbal Gonçalves,
04 de Fevereiro de 2008